Saber cuidar
A sociedade, o grande continente que acolhe o ser humano, chamada sociedade do conhecimento e da comunicação, está criando, contraditoriamente, cada vez mais abandono, exclusões e solidão entre as pessoas. O tipo de sociedade do conhecimento e da comunicação que temos desenvolvido nas últimas quatro décadas, vem ameaçando a essência humana. Na medida que vamos avançando na tecnologia das produções, a serviço de bens materiais, assistimos o ser humano abandonado na sua essência, num desencontro com sua razão existencial.
Escutamos nas promessas políticas: precisamos muito investir na educação, na formação e na informação. Certamente o saber é imprescindível; o saber nos confere o poder. Saber utilizar o poder da ciência e da técnica, de modo construtivo, é o caminho para o crescimento.
A serviço de que projeto do ser humano, da sociedade e do mundo utilizamos o poder da ciência e da tecnologia? A resposta pede mais que ciência, mais que mestrado, em assuntos específicos. A resposta a esta questão é uma filosofia do SER, é uma reflexão espiritual, que nos fale do sentido de todos os sentidos e que saiba organizar a convivência humana, em volta da mesma sinergia, da ética, cooperação, respeito e solidariedade.
A palavra mágica é CUIDAR; cuidar é mais que um ato é uma atitude. O modo de ser cuidado revela de maneira concreta como é o ser humano. Sem o cuidado ele não aprende a se cuidar, nem cuidar do outro. O sintoma mais doloroso já constatado nas últimas décadas, é um difuso mal estar da civilização, embutido no contexto de descuido, descaso e abandono.
Há um descuido pela fragilidade humana, quando o ser se torna não produtivo. Há um descuido pelo respeito nas relações. Há um descuido pela ética de vida na igualdade dos sofrimentos, na atitude de solidariedade a dor. Há um descuido pela urgência de rever valores familiares, dentro de uma sociedade materialista.
A nova filosofia busca um novo caminho: desenvolver no ser humano, o sentimento de pertencer à família humana, à terra, ao universo, ao propósito divino de continuar a construção do mundo. Onde buscar estas respostas quando assistimos o mundo contaminado pelos prazeres momentâneos?
Prazeres muitas vezes destrutivos, como a bebida, a droga, a ganância pelo poder, pelo dinheiro, o abuso do corpo, o vício, o jogo, o domínio pela violência, a compulsão pelo objeto. Sobre o conjunto destas questões devemos refletir com atenção, até construirmos um novo estado de consciência. Buscamos hoje, ansiosamente, uma espiritualidade simples, sólida, baseada na ética da responsabilidade, da solidariedade e da compaixão fundada no cuidado.
Buscamos o valor instrínseco de cada coisa, no trabalho bem feito, na competência, na honestidade e na transparência das intenções. Estas respostas não encontramos prontas em livros, em orientações, em cursinhos. Devemos cavar mais fundo. Elas emergem de um trabalho coletivo, que se faz, caminhando em busca de uma nova matriz. É no processo de crescimento nos grupos de psicodrama, que compartilhamos nossas vidas comuns e simples.
Qual a dose certa do cuidado?
Não há receita. O essencial é o comprometimento com o cuidado. O ser humano é um ser que depende de outro para existir. É um ser das relações, é um ser gregário! Daí o nosso cuidado com as relações, com os vínculos, com os papéis que desempenhamos na vida. Acompanhando na cínica a dificuldade de profissionais da área da educação, saúde e segurança, que precisam estar bem para cuidar, elaboramos um projeto de estudo e tratamento para cuidar de quem cuida.
Hoje já com resultados apresentados em gráficos, e mais importante, através da própria resposta humana de quem participa do programa mantemos junto à secretaria de educação do município, o berço terapêutico do programa “cuidando de quem cuida”.
Através da metodologia psicodramática, buscamos novos olhares, um novo sentir, um ouvir e falar harmoniosos. Buscamos experimentar novas emoções que é compartilhado entre todos. É de uma riqueza ímpar, sentir as emoções de um olhar que aprende a falar, de um afago que sente o acariciar, de um abraço, de um sorriso, de um não sem medo, de um sim sem censura.
É a busca do ser espontâneo e criativo. É partindo das reconstruções relacionais traumáticas de nossa infância, que encontramos a riqueza de nosso interior, que se torna mais capaz de viver e de amar. Durante o processo do grupo, vamos construindo novas histórias, refazendo cenas da vida, traçando novos enredos, desvendando mistérios, regras.
O ser humano só estará pronto quando amar toda a humanidade.
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