O suporte psicológico durante as fases do tratamento do câncer de mama pode ser tão importante quanto a medicação. Esta é a opinião da psicóloga Kethe de Oliveira, uma das profissionais convidadas para o Outubro Rosa Donna SC, que ocorre nesta quarta-feira.
Nesta entrevista, ela explica como as mulheres costumam reagir ao diagnósticos da doença e como elas podem enfrentar seus medos e melhorar a autoestima.
Como lidar com o diagnóstico do câncer de mama?
Kethe – O que eu percebo nas mulheres é baixa autoestima, a preocupação da imagem corporal que fica modificada, isso é notado com muita frequência. Esse é o principal trabalho dentro do ambiente hospitalar porque isso é o que aparece mais, geralmente por causa do processo de dor ou porque fizeram procedimento cirúrgico para retirada da mama. Costumo indicar a Rede Feminina e trabalhamos em parceria com as profissionais da terapia ocupacional também para que retomem a autonomia novamente.
Como melhorar a autoestima dessa mulher?
Kethe – Trabalhar principalmente com o foco da cura, quando existe essa possibilidade, e que a possibilidade de ela voltar a ter um seio reconstruído vai acontecer futuramente. Eu percebo que a questão religiosa também é algo importante, elas se sentem muito amparadas com a questão espiritual.
O que a perda da mama significa para a mulher?
Kethe – A perda da identidade feminina, muitas vezes o medo de não poder ser mãe em função do tratamento e isso reflete na questão de ser mulher. Como eu sou uma mulher se estou mutilada e não posso gerar filhos? No hospital a gente escuta a demanda da paciente, trabalha a questão da autoestima e faz os devidos encaminhamentos. É um trabalho a longo prazo e que deve ser feito em equipe. Há um tempo encontrei uma paciente que teve que fazer mastectomia da duas mamas e ela disse que estava muito feliz porque o tratamento deu certo e hoje tem seios ainda mais bonitos que antes.
E como a paciente pode enfrentar o medo da volta da doença?
Kethe – É preciso viver dia após dia. O discurso do médico também é referência no tratamento, por isso as informações devem ser muito claras, sobre quais são as chances reais de cura. O medo da volta do câncer pode durar muito tempo, mas conforme a paciente vê a evolução do tratamento, esse sentimento diminui. A palavra câncer ainda está associada à morte em nossa cultura, infelizmente, por isso, o trabalho terapêutico tem a função de desmistificar a doença. É preciso mostrar que a pessoa com câncer pode sim ter cura e fazer com que ela entenda o próprio papel no adoecimento.
Quais são os medos mais comuns que essas mulheres enfrentam?
Kethe – A morte, principalmente. Mas não exatamente o medo de morrer e sim como as pessoas, filhos e marido vão ficar, ainda mais quando a mulher ocupa um papel importante na estrutura familiar. Isso pode ser um impulso para que queiram lutar ou, muitas vezes, voltam-se para si mesmas e não dividem a angústia com a família. Ficar no silêncio pode trazer outros adoecimentos emocionais e falta de desejo de realizar suas atividades. Por isso, tentamos conciliar esses sentimentos, mostrar que em alguns dias elas vão estar tristes, e pode até ser um efeito colateral, mas outras vezes estarão dispostas. Há também o medo da transformação no corpo, a preocupação sobre como o outro vai enxergá-la, se ainda irá desejá-la e até como a sociedade vai olhar para essa mulher, já que a mama é um referencial feminino. Então é um trabalho que precisa ser feito devagar, com muito respeito ao tempo de cada mulher.
Como o lado emocional pode influenciar no tratamento?
Kethe – Pode influenciar tanto para o bem como para o mal. Quando eu digo para o mal, falo da desmotivação e da falta de desejo de querer enfrentar a doença. Então não só com o câncer de mama, mas com outras doenças também, o lado emocional está diretamente ligado ao processo do adoecimento. Temos que entender o sujeito como um todo para oferecer um tratamento ideal. O suporte emocional é importante para que ela entenda o que está lhe acontecendo, para que fale dos medos, das angústias. Com o lado emocional controlado, acho que a condição de cura numa totalidade acaba sendo muito maior.
Qual é a importância do apoio psicológico?
Kethe – Eu considero o suporte psicológico tão importante quanto a medicação. O tratamento do câncer de mama é um trabalho em equipe. Temos que oferecer essa ajuda, seja em grupo ou individualmente quando a mulher prefere, mas é preciso que essa ajuda exista. Então não é o trabalho só do médico, é do médico, da psicóloga, da assistente social, da terapeuta ocupacional, entre outros profissionais. Nós já avançamos em muitas coisas, mas precisamos avançar ainda mais. Acredito que esse trabalho em equipe tende a crescer.
Como é o trabalho de um psicólogo nesses casos?
Kethe – Dentro do hospital é a escuta da paciente, o que ela traz de demanda, e aí a partir do que ele me traz eu vou desenvolver o trabalho psicológico. Às vezes, num primeiro momento, ela não vai falar que tem medo, ou as vezes nem vai falar da doença, mas vai falar de outras condições que conforme o passar dos dias a gente percebe que estão ligadas à preocupação do adoecimento. Então é acolher, orientar e encaminhar. Trabalho a possibilidade de morte também, então a gente oferece o conforto da dor, o conforto emocional. Além disso, muitas pessoas eu encaminho para os serviços ou particulares ou da rede municipal.
O que fazer quando a doença volta?
Kethe – A paciente retorna à estaca zero na maioria das vezes. Muitas mulheres não perdem a esperança e o recurso religioso está sempre muito presente, por isso trabalho com isso. Também trabalhamos a autoestima, o enfrentamento, como lidar com os sintomas, etc. Basicamente, primeiro elas trazem a demanda e depois estabelecemos um programa terapêutico, mas nosso trabalho está relacionado à escuta, ao medo e às dificuldades, como elas vão passar por isso.
Crédito REVISTA DONNA – ClicRBS